Ronaldo estava indo para a casa de Silvana. Isso não era novidade, afinal seu namoro já durava mais de dois anos. Durante o trajeto, de aproximadamente 1h50min de ônibus, pensava em coisas bonitas para falar a ela. Tinha um carinho e um amor muito maior do que já sentira por alguma mulher.
Ronaldo sempre gostava de se lembrar do desafio de conquistá-la: Silvana, quase dez anos mais nova que ele, como mulher muito bonita, sempre chamou a atenção de todos os rapazes. E ele, aos 28 anos na época, não sabia como conquistar aquela moça formosa de apenas 18 anos. Mas tinha em mente que a conquistaria, pois sabia do potencial de seu sentimento. Apesar de não ser muito bonito, ser baixo para os padrões femininos, tinha um bom conhecimento, gostava de ler e conversava sobre tudo. Sabia ser simpático, pensava ele sem muita modéstia. E, quando pôde conversar com ela finalmente, começou a enlaça-la.
Ronaldo sempre ria quando a beijara pela primeira vez. Totalmente envergonhado, abraçava Silvana enquanto estavam sentados na escada que levava à casa dela. Colava seu rosto junto ao dela, beijava seu rosto, mas nunca a boca. Até que, num momento de distração dele, ela virou o seu rosto de tascou "aquele" beijo. Assustado, lembra-se que perguntou o que a motivou a fazer aquilo, ao que ela, sorrindo (e ele era apaixonado pelo sorriso dela), disse "sei que você queria, mas como nunca tomava a iniciativa, resolvi te atacar mesmo". Ronaldo acabava rindo quando se lembrava desta gafe.
Hoje era um dia especial: Ela estava voltando de uma longa viagem, a qual ele não teve como acompanhar, por causa de seu trabalho. Ela tinha ligado no dia anterior, dizendo que o amava, e que estava com muitas saudades. Exigiu que ele fosse neste dia à sua casa. e ele gostava de ir lá, a mãe dela era carinhosa e o pai era muito divertido. Às vezes passavam horas contando piadas.
Para surpreendê-la, levava consigo um buquet belíssimo de rosas. E tinha rosa de todas as cores: Brancas, amarelas, vermelhas e, obviamente, rosas. Um buquet de muitas rosas, um pequeno mimo para a mulher que ele amava, e que também o amava muito. Ele sabia que ela era apaixonada por rosas. Lembra-se de quando, sem querer, Silvana espetou um dedo em um espinho, provocando um pequeno sangramento. Com ternura, Ronaldo recordava o momento em que, limpando suas mãos, ouvia-a dizer "as rosas, mesmo belas, se defendem, assim como defendo meu amor". E se lembra com um sorriso enorme da frase que se seguiu após essa: "Eu te amo".
Ronaldo estava quase saltando do ônibus para empurrar o veículo. Achava que estava lento demais, parava em todos os pontos e ninguém subia ou descia. Bem vestido, perfumado, e com um vistoso buquet de rosas, mal se aguentava de tanta ansiedade. Olhando adiante, viu o ponto que tanto desejara naquele dia: Era o ponto em que ele saltaria!
Desceu e, lépido, foi até a casa dela. Deu uma ajeitada em suas vestes, verificou se o perfume ainda estava perfumando. Chegando na casa de Silvana, tocou a campainha. Ninguém atendeu. Tocou de novo, e veio a mãe dela, visivelmente abatida, quase desfalecendo. Rapidamente, Ronaldo a escorou e a ajudou a entrar em casa. Sentia algo de errado. A mãe de Silvana estava aos prantos. Segurando a sua mão, Ronaldo perguntou o que acontecera, já com um aperto no peito, que transformou em violenta ferida quando ouviu aquilo que sempre temera: Silvana tinha ido embora.
Tentando não entrar em desespero, perguntara como. A mãe dela, entre muitos soluços, dissera que o ônibus em que ela viajava chocou-se com um caminhão de produtos inflamáveis, explodindo tanto o ônibus quanto o caminhão. Ninguém sobrevivera, todos morreram carbonizados. Nessa hora, Ronaldo caiu de joelhos. Ele não chorava, não tremia, apenas tinha um olhar opaco, sem brilho e sem vida. Em menos de um segundo, toda a sua vida com Silvana passou diante de seus olhos. Então, dando um abraço longo e apertado na mãe de Silvana, levantou-se e tornou-se a ir para a sua casa. E, com ele, o buquet que mandara fazer com tanto esmero.
No dia do enterro e Silvana, via-se Ronaldo, com a mesma roupa do dia que recebeu a notícia fúnebre. E, em sua mão direita, o mesmo buquet que tinha feito para ela. As rosas haviam murchado. Antes de fechar o túmulo, Ronaldo depositou encima do caixão o buquet, e assim saiu. Ao chegar no lado de fora do cemitério, enfim chorou. Chorou como uma criança de castigo por algo que não fez. Agora tinha certeza que ela tinha ido embora, e para sempre.
Contudo, Ronaldo se lembrou que Deus é o Senhor da vida e da morte, e orou. Pediu a Deus que a abençoasse, e agradeceu a Ele por ter posto mulher tão maravilhosa em sua vida. Ainda brotando lágrimas em seus olhos, pegou o primeiro dos três ônibus que teria que tomar para voltar para casa. Mas, desta vez, ele sorria. Não pela dor, não pela perda, mas por saber que viveu a felicidade, ainda que por pouco tempo.
Se Ronaldo superou tudo isso? Sim, a vida continuou. Mas hoje, quando se lembra dela, não se prende à dor da tragédia, mas sim dos sorrisos que dividiram, dos beijos que trocaram, do amor que um compartilhou com o outro. Sozinho, não acredita que outra pessoa aparecerá em sua vaida para preencher essa lacuna. Entretanto, sabe que para Deus nada é impossível, e por esse motivo não fecha as portas docoração. Antes, deste a chave para Deus.
Isso porque o amor é eterno. E Deus ama cada um de maneira igual. E assim vivemos nossa vida.
Jamais devemos morrer pela perda. Senão apodrecemos nossa alma. E seremos seres sem via. Como as flores murchas de quem um dia amou.
Então, sejamos como as flores da terra queimada, que teimam em nascer mesmo em um cenário desolador. Somos as árvores do Deserto, e nunca devemos esmorecer. A vida continua, e ninguém gostaria de nos ver abandonando-a por causa dela. Antes, precisamos seguir em frente. Sempre em frente. Para ficar em paz com nossa alma. E merecer o sorriso de Deus.
Essa é minha singela homenagem aos familiares que perderam seus entes, seus amores, e que não desistiram de viver.
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