Talvez fosse essa uma noite comum. Após caminhar pela praça, Tânia sentou-se no anfiteatro à frente da lagoa para descansar. Em suas pernas, o cansaço pelo exercício; em sua mente, pensamentos perdidos em tristezas passadas.
Observando o espelho d’água à sua frente, tentava entender o caminho que percorrera até chegar ali. Não faz tanto tempo assim um sonho de amor perfeito se tornou na maior e mais lancinante dor que vivera em sua curta existência de apenas vinte anos. Ludibriada por palavras doces e sedutoras, entregou aquilo que tinha de mais valioso, a sua pureza. E, como num castelo de cartas, viu sua vida desmoronar com a mentira e a revelação que aquela pessoa que tanto desejara já tinha outra mulher, e fora apenas usada para satisfazer seus desejos mais asquerosos.
Tânia observava o reflexo da luz dos postes no lago artificial que havia nessa praça tão próxima a sua casa. Por caminhos tortuosos caminhara, e novamente havia cedido aos seus desejos, seja por vontade própria, seja com más influências dizendo que era normal. E agora, a despeito da intensa movimentação que havia na entrada da praça, Tânia se sentia sozinha na imensidão de uma caverna escura e fria. Apesar de nova, passara por momentos tão humilhantes que sentia vergonha só de pensar. Assim uma lágrima brotou, desceu e caiu no seu pé.
Agora ela se recordava do momento que tudo veio à tona, a reação dolorida de seus pais, que a educaram na doutrina de Deus, mostrando sempre a verdade e o certo. Agora aquele mesmo olhar que sempre foi de alegria e orgulho se tornou de decepção e desconfiança. Por que, pensava ela, fizera tudo às escondidas? Ainda lacrimejava mais quando se lembrou do momento que fora disciplinada na Igreja por seus erros e sua lascívia. Às vezes parece que nós chegamos tão ao fundo do poço que pisamos na lama, mas esquecemos que a corda chega até lá.
Claro que Tânia havia se tornado muito mais exigente em suas escolhas. Não mais buscava uma pessoa bonita, ou com dinheiro, ou com palavras doces. Agora, buscava uma pessoa que fosse fiel a Deus, mas que ao mesmo tempo tocasse seu coração. Por diversas vezes tentara, mas sempre se frustrara. Parecia algo impossível. Porém não somos donos do caminho de Deus. E quando Ele decide responder a uma oração, nenhuma força na Terra é capaz de detê-lo.
Assim por intermédio de outra pessoa ela conheceu Leandro. Uma pessoa que, pelo menos à distância, aparentava servir ao Senhor. E era bonito aos seus padrões, e uma pessoa boa. Pena que tudo isso era à distância. Mas assim mesmo Tânia quis conhecer mais dessa pessoa que se tornava instigadora e interessante.
Nos primeiros contatos, uma decepção: Leandro gostava de outra pessoa. E ele queria ficar com essa pessoa, lutava pra isso, e essa história deixava Tânia ainda mais encantada com ele. Como uma mulher não via o quanto ele vale, pensava ela? Certamente uma louca. Ela, ainda que achasse difícil, continuava a buscar conhecê-lo mais. Mas ele estava distante, muito distante, e isso a entristecia. Por que não existem dois Leandros, pensava ela com seus olhos sonhadores, para que um deles morasse em sua cidade?
Mas de onde menos se esperava veio a notícia que mais doeu: Leandro disse que gostava dela, mas só como amiga. Que não queria nada, além disso, com ela, pois amava outra pessoa que mal conhecia, mas cria nesse amor e que preferia ficar sozinho a ficar com outra mulher. Nesse momento os sonhos de Tânia ruíram. Ela ficou sem chão, seus planos de felicidade pareciam que morriam junto com a esperança de ter um amor de verdade.
E três semanas depois, lá estava ela, sentada na beira do lago, olhar opaco, depois de uma caminhada longa, como se quisesse deixar para trás tudo aquilo que a entristecia. Assim, agachava-se em suas próprias pernas, como uma criança perdida. Nesse momento, uma voz rompeu o silêncio que ela impetrara em sua própria mente:
- Posso me sentar aqui?
- Claro, fique à vontade – Respondeu Tânia, sem olhar.
- Obrigado – Agradeceu a voz – Mas é que sou novo aqui.
- Bem vindo e me desculpe, mas não estou com muita vontade de conversar – Ela disse.
- Posso saber o seu nome? Meu nome é Leandro, muito prazer – Falou a voz, desta vez chamando a atenção de Tânia, pelo nome e pela voz que só agora prestara atenção.
Tânia virou-se, e ao ver o dono da voz arregalou os olhos, pondo a mão no peito, tamanho o susto.
- Espera um pouco – Indagou Leandro – Tânia, é você?
- Le-le-leandro? Nossa, não te esperava aqui...
- Mas estou. Vim pra ficar aqui, mas conheço poucas pessoas.
- E a resposta? Recebeu? Espero que tenha sido boa. Aliás, com certeza foi positiva, né? – Disse, desesperançada, Tânia.
- Bem – Começou Leandro, olhos perdidos no lago – Na verdade, eu criei uma personagem na minha imaginação. Apaixonei-me por uma pessoa que na verdade não era exatamente o que eu idealizei. Mas na vida real ela não era o que eu acreditava, e na verdade ela está feliz com a vida dela. Nunca fui a pessoa certa para ela, mas no fundo do meu coração eu acreditei que seria. No fim de tudo, amei um sonho, uma sombra e um pensamento.
- Nossa – Respondeu Tânia – Não acredito que ela abriu mão de você.
- No coração a gente não manda. Mas me diga, como você está?
E assim começava uma conversa cuja história apenas começava...